O que nos fascina em personagens? A jornada? Os acertos? Os erros? O carisma? Todo novo lançamento de filme ou série me surpreendo com pessoas julgando personagens com uma tal de régua moral da realidade. Se fulano errou em tela, automaticamente é uma “má pessoa” que dever ser desgostada. Porém, muitas vezes é essa imperfeição que tanto nos atrai para essas personalidades fictícias.
Pessoalmente, adoro personagens problemáticos. Desde a mocinha tridimensional ao vilão que ama ser vilão. Assim como a alienante perfeição em tela é confortável, existe algo estranhamente satisfatório no erro. E saber diferenciar o que é ficção e o que é realidade parece ser a chave para se divertir com situações críticas. Que delícia!
Mocinhas também erram
I couldn’t help but wonder…mocinhas tem o direito de errar? Afinal, o que se espera de uma protagonista? Em um melodrama clássico, dependendo do erro cometido pela protagonista, sua pena na história para atingir a redenção é a morte. Essa forma moralista de contar histórias nos rendeu e ainda rende bons produtos, mas existe algo mágico em mocinhas que erram e não são tratadas pelo roteiro como criminosas.
Desde as Helenas do Maneco, passando pela diva hot mess Carrie Bradshaw, chegando nas adoráveis e problemáticas meninas de Yellowjackets é possível se inspirar em personagens femininas que erram. Seja esse erro ser uma péssima mãe, uma amiga ausente ou apenas canibal (hihi).
O lado grotesco feminino, o errado, o incerto, o repudiável pode ser libertador na ficção. Com tantas opções de mulheres fictícias que beiram a perfeição ou uma caricatura do que se pensa ser uma mulher, prefiro as imperfeitas. Sejam seus erros pequenos, ou grandes hipérboles.
O vilão (ou anti-herói) com uma causa
Alguns filmes e séries nos fazem torcer para os vilões ou ao menos, entendê-los. Em x-men 97, é difícil quem não assistiu aos episódios pensando “realmente Magneto…”. Afinal, você duvidaria de um grisalho, imigrante, malhado, bissexual?
Em Planeta dos Macacos: O Confronto, enquanto Cesar tenta negociar a paz com os humanos, Koba é um macaco que não concorda essa abordagem. Diferentemente do líder, Koba não cresceu em um lar amoroso com pessoas, ele foi um animal de testes o que resultou em diversas cicatrizes e traumas. Como explicar para ele que os humanos que estão adentrando a floresta com armas, possuem mais um grande arsenal guardado e mataram um primata filhote merecem uma negociação de paz?
É claro, que o filme constrói uma narrativa que torna a redenção de Koba impossível dentro do filme. Sem mais spoilers por aqui. Só digo que esse filme mudou vidas…
Esses personagens que tem uma história que justifique suas ações, atraem nossa simpatia, alguns mais simpatia que o mocinho (Magento), porque são complexos e erram. São problemáticos, mas a gente entende, ou tenta entender, ou respeita.
Loiras de meia idade
Existe um tipo de personagem muito peculiar que agrada uma camada específica da sociedade e se você está nessa camada, você vai entender. Nossas loiras de meia idade terríveis e amorais reinam no cinema e em nossos corações.
Lydia Tár é a estrela do filme Tár. Regente, manipuladora e orgulhosa, a EGOT da ficção também tem tempo para ser criminosa. O que possivelmente poderia ser atrativo em uma personagem assim que é uma assediadora em série? É complexo. Mas em primeiro lugar: ela não é real. Por que aplicar leis para alguém que nem é alguém de verdade? Quem vê o filme sabe o que é certo e o que é errado, se não souber pode ver um filme da Disney que vai explicar direitinho a diferença!
Em segundo lugar, um filme é feito da construção e do arco dos personagens. No caso de Tár, Lydia não vence e isso faz parte da fascinação com esse estudo de caso tão poderoso. Suas ações, suas trajetória, sua queda, sua tentativa de se manter no topo, tudo a torna um deleite para os olhos do espectador.
Outra loira de meia idade que amo é a protagonista de Serial Mom. Beverly Sutphin, é uma dona de casa comum, mas que esconde um grande segredo: é a responsável pelas ligações obscenas feitas à sua vizinha e ocasionalmente é uma assassina. Divertida, caricata e defensora da reciclagem, Beverly é uma criminosa em um filme feito para você amá-la. Afinal, é um filme do John Waters. Jogue sua régua moral fora, aperte o play e se divirta com as infinitas possibilidades da ficção.
Carismático sem escrúpulos
Ás vezes um personagem é só uma pessoa péssima mesmo. Sem rodeios e meias palavras. Junta essa característica com um carisma inabalável e temos a fórmula perfeita. Como lutar contra o magnetismo?
Selina Meyer, a grande protagonista da série Veep é ardilosa, manipuladora, corrupta, uma péssima mãe e com uma sede de poder imparável. Durante as sete temporadas acompanhamos sua jornada política cheia de traições, posições polêmicas e complôs.
Selina é uma pessoa problemática, mas que vai te conquistar! Os absurdos na tela são pretexto de risada e não de julgamento moral. Quem teria coragem de julgar uma mulher tão engraçada…I mean….
Ele só erra, mas faz parte
O que fazer quando uma série te apresenta como personagem principal alguém que só erra constantemente e de formas cada vez mais sérias? BoJack Horseman é um ator, alcóolatra, egocêntrico e que aos poucos vai envenenando a vida das pessoas ao seu redor. Na série de mesmo nome, ele é o protagonista que não consegue sair desse ciclo vicioso.
Ao longo das temporadas o passado de BoJack é explicado e fica por conta do espectador decidir se isso é justificativa o suficiente para ele ser como é ou não. Em uma boa cartada dos roteiristas, o texto não se desculpa por seu personagem principal.
Com tantos erros, tantas chances perdidas, tantas pessoas afetadas por suas atitudes, como gostar de BoJack? Bom, ele não existe. Quando se gosta dele se gosta da maneira como ele foi escrito.
Sua humanidade, sua incapacidade de acertar e sua busca por uma redenção são os pilares da série. Por que alguém torceria para isso ser diferente? Se ele se regenerasse completamente na segunda temporada? Qual seria o ponto da série? BoJack erra porque foi concebido para errar. Ele erra para dar vida a série.
Personagens que são problemáticos não são iguais a personagens ruins e muitos menos a pessoas ruins. Eles podem ser um espelho, um estudo de caso, até uma projeção, mas são apenas personagens.
EU AMO TANTO PERSONAGENS SEM CARÁTER NENHUM!!!!